sexta-feira, outubro 28, 2011

Crônicas do busão - Divagações femininas

Todo mundo para pra pensar na vida quando está apertado, esmagado ou sentado - antes de dormir e babar - no busão. Bem, decidi que terei uma série aqui no blog intitulada "Crônicas do busão". Já postei o primeiro texto da série que é "Pauta do Dia". A partir de agora vou deixar você com o "Divagações femininas" . Boa leitura!


- PAF!

- Porra, colé sinha puta?!?

- Puta é a senhora sua mãe que gostaria que pegassem naquela bunda velha e caída sem permissão, seu viado!

- Você tá merecendo uma porrada nigrinha! VAGABUNDA!

- Então venha ninho, venha! Se bote disgraça!

Nada aconteceu depois, mas o perigo era constante – nessa rápida história, o babaca do meu vizinho apertou a minha bunda, semanas atrás, e levou uma mão aberta na cara. Depois disso, sumiu. A mãe dele contou para minha vó que ele se mudou para o interior, mas a vovó “descobriu” com uma amiga dela - que trabalha como técnica de enfermagem no Hospital Geral - que disse que o safado está na UTI; a mulher deu com língua nos dentes e contou pra minha vó que ele agarrou a esposa de um fazendeiro de alguma roça braba e levou cinco tiros: dois na cabeça, e três no peito. Não tenho pena; mereceu por ser ousado demais e achar que mulher é lixo. De alma lavada, dou um sorriso de tranquilidade.

 - POW, POW, POW, POW! – pensar num ônibus quando ele passa em alta velocidade por vários buracos de uma avenida esburacada – nesse caso, a Avenida Paralela com sua movimentação intensa, seus carros em alta velocidade e seus barbeiros filhos da puta –, é complicado. Me ajeito no banco duro desse Pituba/ Castelo Branco,  pego minha garrafa com água e uma gota cai na minha calça jeans azul com lycra; um garoto com farda - de algum colégio de mauricinho - olha para minhas coxas. Homens são ridículos desde nascença e na adolescência pioram; a coisa fica mais feia quando viram adultos com o pensamento “mulher-cratera”: mete, mete, mete, mete em todos os nossos buracos, deixa tudo assado e depois de gozar, vira de lado e dorme.

De pensar que o Ed com todo seu charme e aquela cara de foda gostosa quis fazer isso comigo; lembrar que o cara me levou naquele quarto de motel barato, lá na Boca do Rio, só porque o pernoite era 30 reais com jantar incluso; e na hora da foda, uma cama ruim e o cheiro de desinfetante peba que incomodava muito. Quando pensei que as coisas iam melhorar e que ele iria me chupar a boceta, o tapado inventa de colocar o dedo lá dentro – como se isso fosse bom; quando achei que ele ia meter gostoso, o idiota inventa de querer gozar na minha boca; mordi a cabeça daquela rola média e fina e ele parou de me usar como uma qualquer. Acho que o ridículo da noite foi à hora de implorar pelo anal... Tsc. Ele pensou que eu fosse a Sandy, mas não é pra qualquer um que dou à bunda. Tá difícil encontrar um homem que me pegue certo, que não me faça de buraco, que saiba usar sua ferramenta. Bem, o jeito é ver se aparece algum que preste, mas não dou atenção a isso, afinal de contas, preciso de muito mais que uma pica pra me fazer feliz.

Não posso esquecer que hoje é dia de pagamento e é dia de pagar o cartão, o celular, a conta de luz e a conta de água. E pra deixar o dia mais emocionante, minha TPM veio com tudo e além dela, das contas e dos babacas, tenho que acordar cedo pra ir pro estágio e suportar uma colega que quer me convencer que sou lésbica; aguentar as roçadas dos tarados no ônibus, o trabalho na lanchonete da minha mãe – com vários clientes chatos e melequentos e o fedor constante do Comércio – e depois uma noite inteira de aula. Pelo menos pego carona com meu padrasto, que vai buscar minha mãe todo dia no trabalho – estudar no mesmo bairro da empresa da sua família tem suas vantagens. Porque o celular tem que tocar agora?

- Oi Ed, bom dia! Olhe, tô no ônibus! Eu te ligo mais tarde tá? Desculpa não poder falar, é que tá muita zoada aqui dentro e nem tenho como te ouvir. Tchauzinho!

Enquanto o Ed acha que foi o sexo da vida dele, eu só quero alguém que acompanhe meu ritmo em todos os momentos. Acho que essa é uma questão que sempre penso: será que vou ser a solitária que transa com muitos e que não acha ninguém? Será que é tão complicado ser uma mulher que tem uma vida além da sombra de um homem? Será que eu não devia experimentar o lesbianismo? Aí, como eu queria que aparecesse uma luz. Bem, tá na hora de levantar e soltar no ponto. Puxar a corda, andar alguns quarteirões, ouvir piadinhas, suar feito uma louca e começar a trabalhar.

Não vou pensar em nada além da minha vida... – PAM! – Ai que som horrível sai quando puxo essa corda. Trabalho e faculdade: essa vai ser a meta; esse vai ser meu principal... Nossa, que gatinho. Será que ele quer meu telefone?

Sanção Maia
27/10/11

quarta-feira, outubro 19, 2011

Meus dias de rock’n roll – Parte 1

I

Nunca vou esquecer aqueles dias. Sempre que lembro dou boas risadas. Como foi bom e como tudo mudou: conheci a Lisandra - minha esposa -, comecei a ganhar dinheiro, passei no vestibular; iniciei a vida fumante, larguei a Maria Joana e comprei o "Trevoso", meu Fiat 147 vermelho - fodido, mas um grande companheiro. Eram meados de 2005 e eu estava no pré-vestibular e sempre saía as sextas pra tomar uma breja com a turma antes dos ensaios - eram os quatro garotos do Centro, os Strikes Flythers (isso era um nome de banda): Jota (eu, baixo), Marco "The Dogs" (bateria), Cabron (voz e guitarra) e Miltão (guitarra)

Saíamos de Nazaré, onde era o cursinho, só pra beber no bar de Seu Buiú, lá na Barroquinha. Comida barata, cerveja barata, conversa com as baratas que passavam sempre pelo chão. Quando dava umas 15h – chegávamos ao bar quase sempre às 13h30 – subíamos as escadas que davam ao lado do Espaço Glauber em meio aos camelôs, as pessoas vindas da Carlos Gomes ou que subiam da Barroquinha para o Centro; passávamos pela Avenida Sete e sempre parávamos para comprar cigarros na banca em frente da Praça da Piedade ou para conversar com Dona Virginia, que contava histórias de sua vida como puta desde os 18 anos – ela trabalhou como prostituta até os 65 e morreu recentemente, com 71; o Miltão parava sempre na livraria pra ver livros com desconto e aí íamos para o um estúdio bem baratinho no Politeama. Nesse período ainda não tinha carro. O Trevoso só veio depois do vestibular.

Quando chegávamos ao local do estúdio - uma casa vermelha com detalhes brancos e grades pretas-, tocávamos a campainha. O Lima – músico frustrado, que virou dono de estúdio e tecladista de banda de arrocha - olhava pela janela e abria a porta. – Já comeram água né? Bando de bebum! Entra logo e vê se fala baixo pra não acordar a minha cria – Nunca entendi o problema dele: chamar a filha de cria... Bem, íamos pro andar de cima e abríamos os “cases” (umas capas velhas que levavam os instrumentos) das guitarras, plugávamos os instrumentos e começava o esquente.

- Hey ho, let’s go! Hey ho, let’s go! – e nosso esquente era sempre o Ramones. Nosso repertório era bem autoral. Dos outros, mas autoral. A Strikes Flythers tinha apenas dois meses. Para o objetivo inicial, ela dava certo: tocava na casa de amigos, encantava as meninas, ganhava bebida de graça. De três músicas do Ramones no primeiro mês, passamos a tocar Raul Seixas, System of a Down, Legião Urbana, Cazuza e arriscávamos Led Zeppelin, em seis meses. Da casa dos amigos, passamos a tocar em festivais pequenos, bares e festas undergrounds. Não acreditávamos no que acontecia. Estávamos nos tornando um banda de verdade.

II

Lembro do dia que o Cabron trouxe nossa primeira música autoral, no intervalo da aula do cursinho. Estávamos sentados, embaixo de uma árvore de ornamento de calçada, com bancos de madeira pequenos ao redor. Sempre fumávamos ali em baixo por causa da brisa que batia.

- Mans! Fiz uma música! Bem fácil de tocar!

- Canta ela pra gente – pediu o The Dogs.

- Sem violão não dá, né? – contra-argumentou o Cabron – Saí atrasado e esqueci de trazer.

- Canta logo, porra! – pedia de forma sutil.

- Ok... Preparem-se – o Cabron tinha uma voz grave e muito legal de ouvir. Dava umas rasgadas que imitavam nitidamente o Eddie Vedder.

- Era uma tarde fria de verão e eu em casa sem fazer nada então/ Pensei, vou fazer um rock’n roll/ Pensei, eu vou tocar é rock’n roll/ Minha mãe dizia saí daí moleque/ Troca essa roupa e pega a mobilete/ E vai comprar o pão para o café/ E deixe tocar essa música de mané.

- É só isso - disse sem graça - Falta o resto. Pensei na letra em quanto tomava café lá em casa.

Todos pararam. Um silêncio estranho e um medo de falar – até hoje não entendo o por quê. Afinal, até quando acabamos a banda foi pacífico – estava no ar. Então, o sempre salvador Miltão tragou a fumaça do cigarro, olhou pra todo mundo e disse:

- Quero gravar esse som. Hoje ainda! Vamos pegar os instrumentos e começar a terminá-la. Vamos fazer sucesso nessa porra! - A gente levantou, riu e começou a falar o que iríamos fazer com a música. E assim começaram os dias mais loucos das nossas vidas.

Sanção Maia
19/10/11