I
Nunca vou esquecer aqueles dias. Sempre que lembro dou boas risadas. Como foi bom e como tudo mudou: conheci a Lisandra - minha esposa -, comecei a ganhar dinheiro, passei no vestibular; iniciei a vida fumante, larguei a Maria Joana e comprei o "Trevoso", meu Fiat 147 vermelho - fodido, mas um grande companheiro. Eram meados de 2005 e eu estava no pré-vestibular e sempre saía as sextas pra tomar uma breja com a turma antes dos ensaios - eram os quatro garotos do Centro, os Strikes Flythers (isso era um nome de banda): Jota (eu, baixo), Marco "The Dogs" (bateria), Cabron (voz e guitarra) e Miltão (guitarra)
Saíamos de Nazaré, onde era o cursinho, só pra beber no bar de Seu Buiú, lá na Barroquinha. Comida barata, cerveja barata, conversa com as baratas que passavam sempre pelo chão. Quando dava umas 15h – chegávamos ao bar quase sempre às 13h30 – subíamos as escadas que davam ao lado do Espaço Glauber em meio aos camelôs, as pessoas vindas da Carlos Gomes ou que subiam da Barroquinha para o Centro; passávamos pela Avenida Sete e sempre parávamos para comprar cigarros na banca em frente da Praça da Piedade ou para conversar com Dona Virginia, que contava histórias de sua vida como puta desde os 18 anos – ela trabalhou como prostituta até os 65 e morreu recentemente, com 71; o Miltão parava sempre na livraria pra ver livros com desconto e aí íamos para o um estúdio bem baratinho no Politeama. Nesse período ainda não tinha carro. O Trevoso só veio depois do vestibular.
Quando chegávamos ao local do estúdio - uma casa vermelha com detalhes brancos e grades pretas-, tocávamos a campainha. O Lima – músico frustrado, que virou dono de estúdio e tecladista de banda de arrocha - olhava pela janela e abria a porta. – Já comeram água né? Bando de bebum! Entra logo e vê se fala baixo pra não acordar a minha cria – Nunca entendi o problema dele: chamar a filha de cria... Bem, íamos pro andar de cima e abríamos os “cases” (umas capas velhas que levavam os instrumentos) das guitarras, plugávamos os instrumentos e começava o esquente.
- Hey ho, let’s go! Hey ho, let’s go! – e nosso esquente era sempre o Ramones. Nosso repertório era bem autoral. Dos outros, mas autoral. A Strikes Flythers tinha apenas dois meses. Para o objetivo inicial, ela dava certo: tocava na casa de amigos, encantava as meninas, ganhava bebida de graça. De três músicas do Ramones no primeiro mês, passamos a tocar Raul Seixas, System of a Down, Legião Urbana, Cazuza e arriscávamos Led Zeppelin, em seis meses. Da casa dos amigos, passamos a tocar em festivais pequenos, bares e festas undergrounds. Não acreditávamos no que acontecia. Estávamos nos tornando um banda de verdade.
II
Lembro do dia que o Cabron trouxe nossa primeira música autoral, no intervalo da aula do cursinho. Estávamos sentados, embaixo de uma árvore de ornamento de calçada, com bancos de madeira pequenos ao redor. Sempre fumávamos ali em baixo por causa da brisa que batia.
- Mans! Fiz uma música! Bem fácil de tocar!
- Canta ela pra gente – pediu o The Dogs.
- Sem violão não dá, né? – contra-argumentou o Cabron – Saí atrasado e esqueci de trazer.
- Canta logo, porra! – pedia de forma sutil.
- Ok... Preparem-se – o Cabron tinha uma voz grave e muito legal de ouvir. Dava umas rasgadas que imitavam nitidamente o Eddie Vedder.
- Era uma tarde fria de verão e eu em casa sem fazer nada então/ Pensei, vou fazer um rock’n roll/ Pensei, eu vou tocar é rock’n roll/ Minha mãe dizia saí daí moleque/ Troca essa roupa e pega a mobilete/ E vai comprar o pão para o café/ E deixe tocar essa música de mané.
- É só isso - disse sem graça - Falta o resto. Pensei na letra em quanto tomava café lá em casa.
Todos pararam. Um silêncio estranho e um medo de falar – até hoje não entendo o por quê. Afinal, até quando acabamos a banda foi pacífico – estava no ar. Então, o sempre salvador Miltão tragou a fumaça do cigarro, olhou pra todo mundo e disse:
- Quero gravar esse som. Hoje ainda! Vamos pegar os instrumentos e começar a terminá-la. Vamos fazer sucesso nessa porra! - A gente levantou, riu e começou a falar o que iríamos fazer com a música. E assim começaram os dias mais loucos das nossas vidas.
Sanção Maia
19/10/11
Nunca vou esquecer aqueles dias. Sempre que lembro dou boas risadas. Como foi bom e como tudo mudou: conheci a Lisandra - minha esposa -, comecei a ganhar dinheiro, passei no vestibular; iniciei a vida fumante, larguei a Maria Joana e comprei o "Trevoso", meu Fiat 147 vermelho - fodido, mas um grande companheiro. Eram meados de 2005 e eu estava no pré-vestibular e sempre saía as sextas pra tomar uma breja com a turma antes dos ensaios - eram os quatro garotos do Centro, os Strikes Flythers (isso era um nome de banda): Jota (eu, baixo), Marco "The Dogs" (bateria), Cabron (voz e guitarra) e Miltão (guitarra)
Saíamos de Nazaré, onde era o cursinho, só pra beber no bar de Seu Buiú, lá na Barroquinha. Comida barata, cerveja barata, conversa com as baratas que passavam sempre pelo chão. Quando dava umas 15h – chegávamos ao bar quase sempre às 13h30 – subíamos as escadas que davam ao lado do Espaço Glauber em meio aos camelôs, as pessoas vindas da Carlos Gomes ou que subiam da Barroquinha para o Centro; passávamos pela Avenida Sete e sempre parávamos para comprar cigarros na banca em frente da Praça da Piedade ou para conversar com Dona Virginia, que contava histórias de sua vida como puta desde os 18 anos – ela trabalhou como prostituta até os 65 e morreu recentemente, com 71; o Miltão parava sempre na livraria pra ver livros com desconto e aí íamos para o um estúdio bem baratinho no Politeama. Nesse período ainda não tinha carro. O Trevoso só veio depois do vestibular.
Quando chegávamos ao local do estúdio - uma casa vermelha com detalhes brancos e grades pretas-, tocávamos a campainha. O Lima – músico frustrado, que virou dono de estúdio e tecladista de banda de arrocha - olhava pela janela e abria a porta. – Já comeram água né? Bando de bebum! Entra logo e vê se fala baixo pra não acordar a minha cria – Nunca entendi o problema dele: chamar a filha de cria... Bem, íamos pro andar de cima e abríamos os “cases” (umas capas velhas que levavam os instrumentos) das guitarras, plugávamos os instrumentos e começava o esquente.
- Hey ho, let’s go! Hey ho, let’s go! – e nosso esquente era sempre o Ramones. Nosso repertório era bem autoral. Dos outros, mas autoral. A Strikes Flythers tinha apenas dois meses. Para o objetivo inicial, ela dava certo: tocava na casa de amigos, encantava as meninas, ganhava bebida de graça. De três músicas do Ramones no primeiro mês, passamos a tocar Raul Seixas, System of a Down, Legião Urbana, Cazuza e arriscávamos Led Zeppelin, em seis meses. Da casa dos amigos, passamos a tocar em festivais pequenos, bares e festas undergrounds. Não acreditávamos no que acontecia. Estávamos nos tornando um banda de verdade.
II
Lembro do dia que o Cabron trouxe nossa primeira música autoral, no intervalo da aula do cursinho. Estávamos sentados, embaixo de uma árvore de ornamento de calçada, com bancos de madeira pequenos ao redor. Sempre fumávamos ali em baixo por causa da brisa que batia.
- Mans! Fiz uma música! Bem fácil de tocar!
- Canta ela pra gente – pediu o The Dogs.
- Sem violão não dá, né? – contra-argumentou o Cabron – Saí atrasado e esqueci de trazer.
- Canta logo, porra! – pedia de forma sutil.
- Ok... Preparem-se – o Cabron tinha uma voz grave e muito legal de ouvir. Dava umas rasgadas que imitavam nitidamente o Eddie Vedder.
- Era uma tarde fria de verão e eu em casa sem fazer nada então/ Pensei, vou fazer um rock’n roll/ Pensei, eu vou tocar é rock’n roll/ Minha mãe dizia saí daí moleque/ Troca essa roupa e pega a mobilete/ E vai comprar o pão para o café/ E deixe tocar essa música de mané.
- É só isso - disse sem graça - Falta o resto. Pensei na letra em quanto tomava café lá em casa.
Todos pararam. Um silêncio estranho e um medo de falar – até hoje não entendo o por quê. Afinal, até quando acabamos a banda foi pacífico – estava no ar. Então, o sempre salvador Miltão tragou a fumaça do cigarro, olhou pra todo mundo e disse:
- Quero gravar esse som. Hoje ainda! Vamos pegar os instrumentos e começar a terminá-la. Vamos fazer sucesso nessa porra! - A gente levantou, riu e começou a falar o que iríamos fazer com a música. E assim começaram os dias mais loucos das nossas vidas.
Sanção Maia
19/10/11
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