terça-feira, julho 03, 2012

Duas Caras - Parte 1

Essa é a mais nova série do blog. Dessa vez, vou me embrenhar pela tentativa de trazer um pouco de textos policias - contos e narrativas sobre detetives ou criminosos - para essa bodega. Então, sem mais delongas é hora de novidade nessa bagaça!


É difícil manter uma reputação. Duas então é complicadíssimo! Nesse momento, mantenho a carreira mais lucrativa: assassina profissional. Engraçado pensar nisso enquanto termino de catar os miolos de Gilseu Vasconcelos, também conhecido como Gil Catiça. Esse cara – quando você mata e sente o cheiro das suas hemorróidas pútrefatas, você entende o motivo de ser chamado de Catiça - roubou outro cliente meu, do meu outro emprego: detetive particular. É estranho, mas é conveniente - afinal é muito bom você receber dinheiro de dois caras, um deles morrer e não te cobrar o término do seu serviço com ele. Esse meu outro cliente é um ricaço que descobriu que o Catiça roubou uns milhões dele durante uma negociação com uns norte americanos. Sei que é uma fachada para trazer drogas para o Brasil – o documento oficial diz que eles vão trazer lençóis para hospitais-, mas tenho que garantir o meu né? O cara me contratou tanto como detetive quanto como matadora, só que não sabe que tenho os dois empregos. Ai que nojo essas "tripas" cerebrais!

Detesto matar em motel barato: são apertados, fedorentos e chatos para limpar. Acho que a estética tosca do local me dá raiva e não consigo ficar só pra limpar a sujeira feita por mim. Hoje mesmo, eu não sabia que uma .45 faria tanto estrago na cabeça do Catiça, mas acho que o “cliente” vai gostar. Fiz um buraco gigante na entrada e um super gigante na saída. - Uh! Uh! Uh! Que beleza! - Aí meu deus! Meu celular toca agora! Cadê a minha bolsa? Quando o Tim Maia, chama tenho que atender logo o celular. Opa acho que pisei num pedaço da cabeça! Eca! Aí, vem bolsa. Eu tinha que colocar logo no sofá, na entrada do quarto! Ai, peguei!

- Oi Mãe! Como à senhora está?

- Filha, eu tô bem e você? Pensei que você vinha me ver hoje.

- Tô trabalhando mãe, caso novo. Te ligo mais tarde.

- Que som é esse? Barry White? Onde você tá?

- Eu tô na... tô... É...Na cola de um suspeito mãe! Confidencial!

- Confidencial é o caralho! Conta log...

Desliguei. Se minha mãe souber que tirei a vida de uma pessoa só por dinheiro ela é quem vai me matar.

Essa coisa de perseguir o cara de manhã e matar a noite é uma tarefa que demanda sacrifícios – além do fato de sacrificar alguém para outra pessoa. Eu gostava de um emprego que eu podia descansar nos finais de semana, sair com algumas pessoas, ver a família com mais tempo. Esse me dá uma grana boa e adoro os dois, mas já tem um tempo que tenho essa vida dupla, sabe? Ficar ouvindo “quero um serviço limpo” ou “meu marido, aquele filho da puta, está com outra” cansa. São já alguns anos nessa ladainha e quero algo diferente: um petshop, uma confeitaria, uma banca de jornal; qualquer coisa que me afaste um pouco de investigar crimes e cometê-los. Quem sabe né? Acho que fazer bolos é bem melhor que limpar miolos.

Ufa, depois de trinta minutos, posso sair. Tomei um belo banho frio, fui obrigada a matar aquela barata enorme no banheiro – eu devia ter deixado ele vivo pelo menos pra matar essa coisa nojenta. Agora é sair pela janela, aproveitar a noite. Esse nem dava pra transar, porque com aquele fedor, nem pensar. Acho que eu vou numa boate, dançar até cair. Não quero nem parceiro e nem parceira de cama hoje. Afinal, Vilma, a detetive e Sandra, a assassina precisam relaxar.


Sanção Maia
23/06/2012 até 03/07/2012