A rua estava deserta. Era noite, por volta das 23h30. As luzes dos postes mal iluminavam a rua. Lojas, casas, pequenos prédios e um grande armazém no fim da rua completavam o cenário mal iluminado e sombrio. Em meio à rua estreita, de mão e contramão, vinha um rapaz. Vestido com uma camisa de cor amarela e vermelha, bermuda larga de cor azul-marinho, sandálias de cor preta. Tinha pele parda e aparentava ter seus 22 anos. Na sua cabeça reluzia uma careca recém raspada e em seu rosto uma barba por fazer. Ele passa por um poste que ilumina sua face transtornada. Seus olhos transmitem pânico, medo e agonia. Seus passos rápidos e assustados seguem em direção ao armazém abandonado.
O silêncio pairava sobre o local. O rapaz, agora mais próximo do armazém, entrou no beco as pressas. Suas entranhas misturavam-se umas com as outras. Em meio a papéis jogados no chão e a um fedor de urina, o rapaz arria as calças e lá defeca. Em meio ao seu processo de excreção anal, ele começa a vomitar. Em meio às fezes, um vômito amarelo com pedaços de feijão, carne e macarrão. Zonzo com a situação, o indivíduo cai sobre toda aquela podridão. Seus movimentos estão lentos. Da sua boca, nenhum som consegue sair. Ele se arrasta como uma cobra para fora do beco. Seu estado é deplorável. No seu corpo manchas amarronzadas e amarelas se misturam a cor da sua pele e a cor das suas roupas.
Ele não enxerga a rua, ele não enxerga a luz, ele só vê demônios. Em seus olhos, a expressão de horror. Aqueles monstros bizarros com suas garras e presas, com seus olhos ameaçadores, com suas babas ensangüentadas com o sangue do seu braço decepado. Ele olha e se espanta. Seus gritos abalam o silêncio mórbido e indigesto daquela localidade. Moradores acendem as luzes de suas casa e apartamentos e vêem um homem com uma roupa toda suja gritar em desespero para sair dali, para devolverem seu braço, para que todos ele vão para puta que os pariu. Alguns residentes das casas descem e tentam falar com o rapaz que seu braço está no lugar, que não há nada ao seu redor.
- Fujam! Eles estão aqui! Demônios, monstros, putos, veados! Meu braço, que quero meu braço! – Assim grita o rapaz desesperado e aos prantos no meio de uma roda de pessoas que olhavam absortos o braço intacto e a expressão de medo. Todos olham, xingam, reprimem, chutam e o empurram para o beco. O “filho-da-puta”, assim ele foi chamado, caiu e ali com sua cabeça sangrando, se encolheu e chorou.
O mundo ao redor dele é demoníaco. Encolhido na posição fetal, ele chora lágrimas tóxicas. Seu corpo e roupas sujos de fezes, vômito e agora de urina, precisa da “brita”. Sua cabeça jovem e atormentada adormece com seus demônios, sem seu braço e sua vida jogada fora.
Sanção Maia
Sanção Maia